quarta-feira, 18 de abril de 2012

Políticas capilares

Angela Davis, ativista do movimento negro americano


Com certa frequência, vemos nos meios de comunicação alguma notícia envolvendo a combinação discriminação + cabelos. Em dezembro de 2011, vimos o caso da estagiária assediada pela diretora da escola onde trabalhava por conta de seus cabelos crespos e de sua aparência corporal, considerados inadequados para aquela instituição de ensino. Mais recentemente, em março deste ano, uma aluna foi abordada e impedida de entrar em uma universidade no Pará pelo fato de seu cabelo e suas roupas serem “impróprios”. E fora os casos que chegam ao conhecimento do grande público, com frequência sabemos de alguém que precisou modificar os cabelos com o intuito de se encaixar no perfil de entrevistas e seleções de emprego – seja cortando baixinho, no caso dos homens, ou alisando, no caso das mulheres.

A estagiária Ester Cesário

De onde vem essa ideia de que o cabelo crespo ou encarapinhado não é apresentável ou formal o bastante para um ambiente de trabalho ou acadêmico? Parece que, enquanto negros, nossa “boa aparência” só é obtida disfarçando ou escondendo algo que nos identifica como aquilo que somos. Nós, negros, nunca estamos “prontos”: precisamos sempre ser ajeitados, ajustados, para nos inserirmos em determinados meios sociais. Será que somos “naturalmente inadequados”?

É chocante que esse tipo de fato aconteça ainda nos dias de hoje, e em um país como o nosso, onde a população é majoritariamente negra e miscigenada. Nesta suposta democracia racial em que vivemos, nossos cabelos naturais não deveriam ser motivo de estranhamento ou exclusão. Se são, é sinal de que essa democracia não é “tão democrática” assim...

Eu acredito que nossa aparência externa é uma espécie de mensagem visual que sinaliza para os outros algo daquilo que somos. Por mais que neguemos, nossas escolhas estéticas refletem sim, em parte, características da nossa personalidade. O mesmo vale para o nosso cabelo. Eu sei que eu não sou o meu cabelo (ele não me define totalmente, não esgota todas as possibilidades sobre quem eu sou), mas também sei que meu cabelo diz muito sobre mim. 


Por isso, eu considero nossos cabelos como que uma afirmação daquilo a que viemos. Se nossos cabelos naturais são motivo não apenas de olhares de reprovação e comentários de mau gosto, mas chega ao extremo de virar caso de polícia, como vimos nas histórias destas duas moças citadas, então eles não são uma mera questão estética ou de gosto pessoal: nossos cabelos são uma questão altamente política. Optar pelo natural e sustentar essa decisão é, portanto, também escolher entre conformar-se ou afirmar-se.

4 comentários:

  1. Ótimo, adorei o texto!

    ResponderExcluir
  2. parabéns pelo blog é maravilhoso,seus posts são ótimos...um xeru da Rose

    http://blogtopodendo.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir